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Emilio Rodrigué, sua Pénélope, sua Roma Negra

Foto de Emilio Rodrigué publicada no site Página 12

Emilio Rodrigué é um dos grandes nomes da psicanálise latinoamericana. Argentino, morou na Londres do pós-guerra e na Califórnia, e foi se radicar na Bahia em 1975. Foi supervisionado por Mrs. Klein e Winnicott, atendeu crianças, aventurou-se pela análise de grupo e manteve um diálogo aberto com especialistas do mundo todo, iniciando um excelente trabalho na Bahia, carinhosamente apelidada por ele de Roma Negra. Morreu, em Salvador, no dia 21 de fevereiro de 2008, alguns dias depois do Carnaval.

Não conhecia nada sobre ele até alguns dias atrás, quando Tia Tania me recomendou a leitura de Heroína, bestseller que Rodrigué publicou em 1969 em versão original (espanhol) e ganhou em 2007 uma versão em francês da editora Payout & Rivages, sob o título Pénélope (aqui, mais livros do escritor disponíveis na loja Amazon.fr). O livro foi encomendado pela Amazon.fr na mesma hora e chegou ontem. É uma edição bonita (e pesada, adoraria poder ler no Kindle) e já li os primeiros capítulos do livro. Em linhas gerais, o enredo é o seguinte: uma jovem e brilhante intérprete, Penny, vai a uma estação de esqui na Argentina para trabalhar num Congresso de Psicanálise. Lá, conhece Yoshidé, que participa do congresso e também esquia nas horas vagas. O turning point consiste na morte do jovem esquiador — ainda não sei como se dá o encontro entre os dois — Pedro/Peter, em muitos aspectos o oposto psíquico de Penny. A partir de então, “tudo se mistura em seu espírito, a mitologia familiar, a morte do irmão, os amantes“.

Identifiquei-me muito com Pénélope. Logo no primeiro capítulo do livro, em plena noite de Natal, ela aguarda um telefonema durante um dia inteiro, de forma ansiosa e desesperada. Não pode reagir de outra forma, pois deve comportar-se como uma lady. Se o processo desencadeado pelo acidente consiste na libertação de uma sociedade com regras nonsense ou de si mesma, ou ainda de ambas, não posso responder, mas se ela se liberta de si mesma, dos pequenos desesperos do dia-a-dia que na verdade são manifestações de um caso clínico muito mais abrangente, identifico-me, sim, com ela. Embora acredite que essas manifestações sejam, no fundo, aquilo que nos protege de entrar em contato, de uma só vez, com o mundo inteiro da nossa realidade.

Assim que terminar o livro, escreverei de novo, aqui.

Rodrigué morou mais de 30 anos na Bahia e foi amigo de Tia Tania. Viveu entre quatro países, um verdadeiro cidadão do mundo, mas resolveu ficar mesmo foi em Salvador. Fiquei impressionada com a sua imensa sensibilidade, de que a Bahia certamente é testemunha. E comecei a pensar nas minhas noites solitárias na França, quando a Bahia era o meu país muito mais do que o estado de origem de parte de minha família. E se descobrir baiano(a), em qualquer idade ou fase da vida, é uma coisa e tanto. Por isso vou terminar com uma frase extraída da mini-biografia de Rodrigué disponível no site Projetos Terapêuticos:

Você já leu Emilio Rodrigué? Não? Então leia. E se não foi à Bahia, também vá.